O que a
Dança Ensina
Reclamar
do tédio é fácil, difícil é levantar da cadeira para fazer alguma coisa que
nunca se fez. Pois dia desses aceitei um desafio: fiz uma aula de dança de
salão. Roxa de vergonha por ter de enfrentar um professor, um espelho enorme,
outros alunos e meu total despreparo. Mas a graça da coisa é esta,
reconhecer-se virgem. Com soberba não se aprende nada. Entrei na academia
rígida feito um membro da guarda real e saí de lá praticamente uma mulata
globeleza.
Na verdade o simples prazer de
dançar bastaria para justificar a prática, mas vivemos num mundo onde todos se
perguntam o tempo todo “para que serve?”. Para que serve um beijo, para que
serve ler, para que serve um pôr-do-sol? É a síndrome da utilidade. Pois bem,
dançar tem sim uma serventia. A dança nos ensina a ter confiança, se é que
alguém ainda se lembra o que é isso.
Hoje ninguém confia, é verbo em
desuso. Você não confia em desconhecidos e também em muitos dos seus
conhecidos. Não confia que irão lhe ajudar, não confia que irão chegar na hora
marcada, não confia seus segredos, não confia seu dinheiro. Dormimos com um
olho fechado e outro aberto, sempre alertas, feitos escoteiros. O lobo pode
estar a seu lado, vestindo a tal pele de cordeiro.
Então, de repente, o que alguém
pede de você? Que diga sim. Que escute atentamente a música. Que apóie seus
braços em outro corpo. Que se deixe conduzir. Que não tenha vergonha. Que
libere seus movimentos. Que se entregue.
Qualquer um pode dançar sozinho.
Aliás, deve. Meia hora por dia, quando ninguém estiver olhando, ocupe a sala,
aumente o som e esqueça os vizinhos. Mas dançar com outra pessoa, formar um
par, é um ritual que exige uma espécie diferente de sintonia.
Olhos nos olhos, acerto de ritmo.
Hora de confiar no que o parceiro está propondo, confiar que será possível
acompanhá-lo, confiar que não se está sendo ridículo nem submisso, está-se
apenas criando uma forma diferente e mágica de convivência.
Se os casais hoje, dedicassem um
tempinho para dançar juntos, mesmo em casa - ou principalmente em casa – muitas
discussões seriam poupadas. É uma espécie de conexão silenciosa, de pacto, um
outro jeito de fazer amor.
Martha Medeiros